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Desamparo e Sentido

O humano é um ser desamparado, entre todos os seres é aquele que mais necessita dos outros de sua espécie para sobreviver. Nenhuma criança sobreviveria sem a presença de ao menos um adulto para cuidar-lo, nutri-lo e oferecer afeto. O que coloca todos em um estágio inicial de dependência.


Já adultos, com nossa capacidade de trabalhar desenvolvida, não temos forças para prover de tudo que necessitamos e precisamos de um sistema de trocas colaborativas para sobreviver. Nenhum homem produziria tudo que precisa de roupa, alimentação, moradia, etc; é necessário alguma forma de colaboração social para sobreviver. Vivemos em um sistema de interdependência.


Ainda, como todos os seres vivos estamos sujeitos a morte, porém com a diferença de possuímos plena consciência de sua inevitabilidade. Se isso já não bastasse para a impor-nos angústia, sabemos da fragilidade do nosso corpo aos agentes externos.


Com isso, enfrentamos também o tempo e envelhecimento. Assim, sabemos que temos um determinado tempo para existir, o que limita nossas possibilidades. O que quisermos fazer com nossa existência terá que se dá em um período limitado de tempo, logo, não podemos “fazer tudo” e assim, temos que escolher o que fazer e o que irremediavelmente, coloca-se também como escolher o que não fazer, assim, temos que abrir mão de algumas possibilidades, para concretizar outras.


Essa tema foi amplamente explorado pelos filósofos existencialistas (Sartre, Kierkegaard, Camus) e atualmente, retomado por terapeutas existenciais, entre os quais, o terapeuta e escritor Irvin Yalom, para o qual, nossas psicopatologias vêm desse enfrentamento com o desamparo da existência. Em outros termos, não existe nenhuma garantia na existência, por exemplo; o paciente obsessivo é aquele que busca de toda forma controlar a existência, o depressivo desistiu da existência, etc.


É importante ressalvar que os termos depressivos, obsessivos, entre outros comuns à psicopatologia, não são para os existencialistas categorias a serem fixadas em pessoas e sim, possibilidades da existência presente em todos.


É certo também que o panorama não é tão desolador, que na existência também existe prazer, alegria, felicidade, afeto, amor e muitos outros sentimentos positivos. Mas a pergunta que insurge é o que fazer diante disso tudo? Vamos viver na busca efêmera de prazer por si só?


A resposta existencialista, principalmente, segunda uma tradição da psicologia existencial de Rollo May, Viktor Frankl e Irvin Yalom, é que sim, é possível viver assim, em função da produção de tais sentimentos e emoções, apesar de ser provável que isso não se sustente e que existe uma melhor maneira de se buscar alegria e felicidade na vida.


Do desamparo surge a necessidade de fazer algo com a existência. Diante do desamparo e da possibilidade da felicidade somos chamados a responder a isso, a resposta encontrada é a possibilidade de criar/produzir um sentido a nossa existência. Sentido que não é produzido partindo apenas de interior, mas sim de um encontro verdadeiro com o mundo.


Então, a partir de encontro com o mundo, é que usando nossas forças produzimos arte, religião, ciência, amor, amizade, família, etc, pois encontramos sentido em reunir nossos melhores esforços para construir e conservar uma amizade, família religião, etc.


Podemos viver apenas por sobreviver e obter de prazer, buscar um trabalho que nos proporcione o suficiente para te conforto, buscar o prazer nas relações, mas também podemos fazê-lo, para além disso, no intuito da produção de algo maior, como no sentido inicial da palavra religião, da nossa re-ligação com o mundo.

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